Homenageada com seu nome na lei federal nº 11.340/2006, que impõe mais rigor na punição à violência doméstica e familiar, a biofarmacêutica cearense Maria da Penha é o principal símbolo feminino nessa luta. Na última quarta-feira, nove de abril, ela participou de um simpósio promovido entre pela Comissão da Mulher Advogada da OAB – subseccional Caruaru e a Asces, que debateu entre os assuntos a aplicabilidade da Lei. Confira aqui entrevista exclusiva.

Portal Asces – Qual a principal mudança gerada com a Lei Maria da Penha?

Maria da Penha – Agora, todo caso de violência doméstica contra a mulher é considerado crime. Todo registro de agressão vai gerar um inquérito policial, que será remetido ao Ministério Público. O julgamento será realizado nos Juizados Especializados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher ou, enquanto estes não forem criados, nas Varas Criminais.

Portal Asces – Mesmo com a implantação da Lei ainda é preciso algum tipo de mobilização?

Maria da Penha – É importante agora que as mulheres se fortaleçam para exigir do poder público os mecanismos para coibir a violência doméstica. Como exemplo, há as delegacias da mulher. Nas cidades que não as possuem, deve haver um núcleo de proteção à mulher. Até mesmo porque quando uma mulher denuncia acaba estimulando as outras a denunciarem também.

Portal Asces – A senhora acha que houve uma conscientização maior das mulheres após da criação da Lei Maria da Penha?

Maria da Penha – Sim. Acredito que de boca em boca, atingimos resultados positivos com o repasse dos direitos das mulheres. A imprensa também mostra sua importância e eficiência, no momento em que apresentam casos e fatos sobre a Lei. Assim, acaba conscientizando mais gente de modo mais rápido.

Portal Asces – Como a senhora se sente em ter emprestado seu nome para a Lei?

Maria da Penha – Sinto-me muito recompensada nesses vinte e três anos de luta. Foram 19 anos para que meu agressor fosse preso. No entanto, acho que não houve ainda a justiça necessária sobre o crime que sofri. Não pela parte dele ser preso e passar dois anos em detenção, mas sim por demorar tanto tempo para que houvesse uma mobilização e eu conseguisse aquela pena para ele.

Portal Asces – Qual a sua avaliação sobre a Lei, que passou a vigorar no ano passado?

Maria da Penha – A lei está correta e precisa funcionar tal qual foi criada. É preciso sim que o Poder Judiciário trabalhe em favor da legislação e possa dar despachos em até 48 horas. Para que não aconteçam os ciclos de violência que são: a agressão, reconciliação e lua-de-mel. Na hora que este agressor for denunciado e punido com uma agressão mais leve, ele vai se conscientizar que existe um dispositivo que pode o puni-lo e assim acredito que estas agressões diminuirão.

Portal Asces – Você se tornou um símbolo contra a violência doméstica no Brasil. Seu exemplo de luta já está consolidado. Agora quais são seus planos?

Maria da Penha – Estou sendo requisitada para estar presente em vários locais, sempre levando meu relato e experiência no combate à violência contra a mulher. Eu não tenho parado de viajar. Onde chego sempre ressalto que o movimento de mulheres não deixou de lutar. Temos agora um desafio muito maior, que é a efetiva implementação das políticas públicas previstas na lei.

Portal Asces – É necessário que as mulheres passem por situações semelhantes para que outras soluções judiciais possam surgir?

Maria da Penha – No caso da violência doméstica e familiar contra as mulheres não. No entanto, existem outros tipos de violência em que o Brasil é cobrado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, por exemplo.

História de Maria da Penha

Maria da Penha – No ano de 1983, a biofarmacêutica ficou paraplégica depois de levar um tiro nas costas, disparado pelo marido, o professor universitário Marco Herredia. Quinze dias depois da tentativa de homicídio, o marido ainda tentou eletrocutá-la enquanto tomava banho. A punição para Herredia só aconteceu dezenove anos depois, sendo condenado a oito anos de prisão. O agressor cumpriu apenas dois anos da pena e hoje já está em liberdade. Desde que sofreu a violência, Maria da Penha começou a atuar em movimentos sociais contra violência e impunidade e hoje é coordenadora de Estudos, Pesquisas e Publicações da Associação de Parentes e Amigos de Vítimas de Violência (APAVV), no estado do Ceará.