A conclusão é de um estudo feito no Centro de Pesquisas do Câncer Fred Hutchinson, nos Estados Unidos, cujos resultados estão publicados na edição de 22 de junho da revista Science.

A pesquisa analisou o extinto retrovírus pan-troglodita endógeno (PtERV1). “Esse vírus antigo representa uma batalha que os humanos venceram. Hoje, o homem não é suscetível a ele. Entretanto, descobrimos que, durante a evolução, essa imunidade inata a um vírus pode nos ter tornado mais vulnerável ao HIV”, disse Michael Emerman, que coordenou o estudo.

A primeira evidência da imunidade humana ao retrovírus surgiu durante o seqüenciamento do genoma do chimpanzé, quando um grupo da Universidade de Washington, liderado por Evan Eichler, verificou que a principal diferença entre os genomas do homem e do chimpanzé era a ausência ou presença do PtERV1. “Chimpanzés têm 130 cópias do PtERV1; o homem, nenhuma”, disse Emerman.

Estima-se que os retrovírus tenham começado a invadir o genoma dos primatas há muitos milhões de anos. Como resultado desse processo, os humanos dividem muitos fragmentos de DNA retroviral com os demais primatas. Tais vestígios de infecções primitivas, tornadas inativas por incontáveis mutações genéticas desde então, correspondem hoje a cerca de 8% do genoma humano.

Os pesquisadores consideram que a proteção inata contra o PtERV1 nos humanos pode ser devida à presença de um gene responsável pela defesa antiviral, chamado Trim5α. Esse gene produz uma proteína que se liga ao vírus e o destrói antes que ele consiga se replicar dentro do organismo invadido.

O grupo de Emerman usou seqüências do genoma do chimpanzé para reconstruir uma parte do PtERV1. Após reunirem dezenas de seqüencias, conseguiram montar um quinto do vírus, informação que foi usada para a obtenção de um genoma parcial. Durante a reconstrução, o segmento se mostrou debilitado, mas permitiu uma rodada de infecção em células de laboratório.

Os pesquisadores descobriram que a proteína antiviral Trim5a neutralizou efetivamente o retrovírus extinto – que afetava chimpanzés e gorilas há cerca de 4 milhões de anos, mas nada fazia aos ancestrais do homem moderno. Ou seja, provavelmente graças à ação da Trim5α, o PtERV1 não conseguiu se fixar com sucesso no genoma humano.

“Apesar disso, enquanto a Trim5a pode ter servido muito bem aos humanos há milhões de anos, essa proteína não parece ter tido qualquer efeito na defesa contra retrovírus que atualmente atingem os humanos, como o HIV. Essa antiga defesa acabou direcionando a evolução humana para uma maior suscetibilidade ao HIV”, disse Emerman.

Os cientistas verificaram que mudanças na Trim5α a tornaram mais capacitada a combater o PtERV1, mas acabaram inibindo sua capacidade de enfrentar o HIV, o que indicaria que o gene antiviral funciona bem contra apenas um vírus de cada vez. “A resistência ao PtERV1 teve um custo, uma vez que reduziu a resistência a outros retrovírus, como o HIV”, afirmaram os autores.

O artigo Restriction of an extinct retrovirus by the human Trim5α Antiviral Protein, de Michael Emerman e outros, pode ser lido por assinantes da Science em www.sciencemag.org.