O estresse é como um combustível. Em momentos de risco, eleva os hormônios adrenalina, noradrenalina e cortisol, dando mais poder de reação. Mas, quando isso é constante, o organismo fica sobrecarregado e a adrenalina vira uma inimiga. Numa crise, a tensão se torna rotina para quem trabalha e enfrenta o medo do desemprego. Quem está desempregado sofre da mesma forma. Todo o País perde. O estresse é considerado doença ocupacional desde 1999. Estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que a União Europeia perdeu até 4% de sua economia por problemas mentais em trabalhadores. “Os prejuízos provocados pelo estresse ocupacional são visíveis: atrasos, aumento de falta e licença médica. Os prejuízos ainda são percebidos pela baixa criatividade, problemas interpessoais, desorganização e demora na tomada de decisão”, diz a psicóloga Suely Mendonça.

Os efeitos vão de tensão muscular e dermatite, a doenças mais graves, como hipertensão, problemas digestivos e diabetes. “Cortisol elevado altera a mucosa do estômago, gerando gastrite. O hormônio também aumenta a quantidade de glicose. Por longos períodos, pode predispor a diabetes”, explica o professor do departamento de psiquiatria da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Amaury Cantilino. Há fases diferentes no estresse. A primeira é de alerta. Se o fator estresse perdurar, há resistência na tentativa de manter o equilíbrio e o organismo fica enfraquecido. A persistência da tensão gera a quebra da resistência, a memória é afetada, a ansiedade se instala. Por último, chega a exaustão, em que doenças graves ocorrem, atingindo órgãos de maior vulnerabilidade genética ou adquirida.

A bancária Orácia (nome fictício), 39 anos, passou por isso. A somatização do estresse no dia a dia do trabalho se manifestou em 2010. “Eu não podia expor emoções, era um robô. Cheguei a fazer cirurgia de vesícula e depois de oito dias tive apendicite aguda. Os médicos disseram que estava sob alto nível de estresse.” Por se recusar a tratar as causas emocionais, em 2012, teve um ataque de pânico. Na recessão atual, Orácia vive sob o medo do desemprego. “Penso: ‘será que eu vou ser uma funcionária cara para essa instituição e vão querer me cortar?’”, diz. Ela faz tratamento psicológico. A falta de trabalho é um fator de estresse que pode levar a uma doença ou agravar uma condição já existente. Marcos (nome fictício), 37, tem psoríase, doença autoimune que provoca placas vermelhas na pele. Desempregado há dois anos, sente que sua condição se agravou. “Sinto muita coceira, chega a ferir, e dor de cabeça. Durmo de duas a três horas por dia.” A doença piora com o orçamento apertado, já que Marcos não pode manter o plano de saúde. Há um ano, interrompeu o tratamento para ajudar o pai que convive com a doença de Parkinson. Todo o dinheiro que consegue, por meio de bicos, é para os remédios do pai.

Entre 2015 e 2016, 1,4 milhão de pessoas deixou de ter plano de saúde. São pessoas como Marcos que, sem renda fixa, agora recorrem ao quase sempre precário SUS.

Estresse provoca doença cardíaca

As doenças cardiovasculares sofrem influência direta do estresse e são as principais causas de morte no Brasil, com 350 mil óbitos, todos os anos. Entre os problemas mais comuns, estão arritmia e hipertensão arterial, que acometem 47,5 milhões de brasileiros. Diante do estresse extremo, é comum sentir palpitações – batimentos fora do ritmo. Se a alteração for confirmada por exames, recebe o nome de arritmia. A taquicardia, aceleração da frequência cardíaca normal – entre 60 e 100 batidas por minuto -, é outra consequência. “Gente estressada fica ansiosa. Quem fuma passa a fumar mais. Da mesma forma com a bebida e a comida, o que gera aumento da gordura corporal, dos níveis de colesterol e glicose e afeta o sono, uma das coisas mais importantes para manter o sistema cardiovascular bem”, diz o diretor da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Celso Amodeo.

O estilo de vida do mecânico Juliano (nome fictício), 33 anos, mudou depois que foi demitido. Em um ano engordou 15 quilos e passou a sofrer de insônia. Ele era responsável pelo sustento da mulher e do filho. Hoje, o orçamento da casa é baseado na aposentadoria da mãe e, para tentar ajudar, ele trabalha como motorista do Uber. Durante a semana, roda até 12 horas por dia. Nos fins de semana, já chegou a 18 horas, que lhe renderam R$380 – fora o desconto de 25% da empresa. Mesmo assim, não consegue pagar o consórcio do carro, sua única fonte de renda atual. No último Natal, começou a sentir dores de cabeça que não passavam. No médico, descobriu que a pressão estava em 18 por 12. Mesmo com os remédios, ela não baixa mais que 14 por 12. “Estou procurando, mas emprego não tem.”

O medo de uma doença grave é o principal motivo que leva as pessoas aos consultórios. A preocupação surge de palpitações no peito, falta de ar, batimento acelerado, suor frio. Sensação de morte. Os sintomas são, geralmente, relacionados a problemas cardíacos, mas podem ser a manifestação de um ataque do pânico, outra consequência do estresse. “A confusão entre doenças psíquicas e problemas cardíacos é antiga. Todo cardiologista já atendeu pacientes achando que achavam que estavam tendo um infarto, arritmia. Mas, depois de uma investigação detalhada, fica claro que é psicossomático”, diz a cardiologista do Hospital das Clínicas da UFPE, Catarina Dias. A pressão exagerada no trabalho levou Sônia (nome fictício), 39, com frequência ao cardiologista. Ela sofria de taquicardia e hipertensão, mas o problema não era resolvido. A situação no banco onde trabalhava piorou. Sônia teve um ataque de pânico. “Estava vendo TV. Infelizmente estava falando da crise que começou nos EUA. Comecei a achar que o jornalista estava saindo da televisão e queria me enforcar, comecei a visualizar aquilo, a gritar”, conta Sônia. Desde 2009, ela passa por tratamento psiquiátrico.

Fonte: Jornal do Commercio