O Conselho Federal de Medicina (CFM) determinou que pacientes com suspeita de morte encefálica deverão ser observados e tratados por no mínimo seis horas antes do início do protocolo que confirmava ou não a falta de atividade cerebral. Antes, o protocolo para determinar a ausência de atividade no cérebro era iniciado imediatamente. Agora, pacientes obrigatoriamente devem ser tratados por no mínimo seis horas a partir da suspeita e, só aí, os exames de confirmação podem ser feitos.

Somados os períodos, a determinação da morte cerebral só poderá ocorrer após sete horas (seis horas de observação + uma hora de exames). A suspeita da morte cerebral começa quando o médico observa alguns sinais. São eles:

  • Coma não perceptivo (coma profundo);
  • Falta de reatividade supraespinhal (ausência de reflexos motores);
  • Apneia (ausência de respiração) persistente;
  • Presença de lesão encefálica de origem conhecida e irreversível;
  • Temperatura corporal acima de 35 °C.

 

Resumo das novas regras

Como era: O médico suspeitava de morte cerebral e poderia começar imediatamente o protocolo de confirmação
Como fica: Após a suspeita, o paciente deve ter acesso a todos os tratamentos possíveis por no mínimo seis horas. Passado esse período, o processo de confirmação pode ser iniciado

Fonte: Conselho Federal Medicina

Nos últimos 20 anos, houve mais de 100 mil diagnósticos de morte encefálica no país. Nenhuma delas, de acordo com o CFM, foi contestada.

As novas normas devem ser publicadas em até 72 horas no Diário Oficial da União e alteram as regras atuais, vigentes desde 1997.

De acordo com o relator da nova resolução, Hideraldo Cabeça, essas mudanças dão maior segurança ao procedimento. Além de neurologistas, também estarão habilitados a diagnosticar morte encefálica intensivistas, intensivistas pediátricos, neurocirurgiões e médicos de emergência. Familiares também poderão indicar um profissional de confiança.

Aparelhos serão desligados após a confirmação

O CFM anunciou também um decreto que será publicado nos próximos dias pelo Ministério da Saúde.

Segundo o documento, passado o período de tratamento e confirmação da morte, não será mais possível que o paciente fique no hospital com os aparelhos ligados.

Antes, o médico deveria aguardar uma posição da família. Agora, se não for possível a doação de órgãos – seja pela decisão de familiares ou por circunstâncias da morte – os aparelhos serão desligados após o período de tratamento e confirmação.

 

Exames clínicos e complementares

Além do exame clínico, que deve ser realizado por dois médicos diferentes, com um intervalo mínimo de uma hora entre o primeiro e o segundo, o paciente deve ser submetido a um teste de apneia e a exames complementares.

"É obrigatória a realização desses exames para que seja demonstrada, de forma inequívoca, a ausência de perfusão sanguínea ou de atividade elétrica ou metabólica encefálica e, também, para que se tenha uma confirmação documental da situação", disse Hideraldo Cabeça.

Os exames podem ser angiografia cerebral, eletroencefalograma, doppler transcraniano e cintilografia. O laudo deve ser assinado por profissional com comprovada experiência e capacitação para a realização desse tipo de exame, afirmou o conselho.

O paciente também deve ser submetido a um teste de apneia, que estimula o centro respiratório de forma máxima. Com a nova resolução, apenas um exame será suficiente – antes, eram feitos dois.

 

Qualificação específica

Pelos critérios anteriores, a morte encefálica deveria ser diagnosticada por dois médicos. Um deles, necessariamente, deveria ser neurologia. O outro não precisava ter habilitação específica.

Com a nova resolução, os dois médicos devem ser especificamente qualificados. Um deles deve ser das seguintes especialidades: medicina intensiva adulta ou pediátrica, neurologia adulta ou pediátrica, neurocirurgia ou medicina de emergência.

Para ser considerado qualificado, o médico deve ter no mínimo um ano de experiência no atendimento a pacientes em coma, tenha acompanhado ou realizado pelo menos dez determinações de morte encefálica ou tenha realizado curso de capacitação. Nenhum dos dois médicos pode fazer parte da equipe de transplantes.

 

Cursos de capacitação

Os cursos devem ter duração mínima de oito horas, sendo quatro de discussão de casos clínicos. As aulas práticas devem ter um instrutor para no máximo um grupo de outo alunos. Deve haver suporte remoto para esclarecimento de dúvidas por, no mínimo, três meses.

Além disso, será obrigatório que o médico tenha experiência de ao menos um ano em atendimento de paciente em coma para que ele possa participar do curso.

 

Transplante de órgãos

Determinada a morte encefálica, 15 órgãos podem ser doados: coração, pulmão, fígado, pâncreas, intestino, rim, córnea, esclera, osso, cartilagens, tendão, menisco, fáscia, valva cardíaca e membrana amniótica.

Em 2016, o Brasil realizou mais de 24 mil transplantes, sendo 14.641 de córnea; 5.492 de rim; 2.362 de medula óssea; 1.880 de fígado; e 357 de coração. Segundo o Ministério da Saúde, pelo menos 41.525 pessoas aguardam na fila por um órgão novo. A maior espera é por rins: 25.623 pessoas. A de coração tem 350.

No Brasil, 14,58% das doações potenciais não são concluídas. O índice de doação é de 16,2 por milhão de habitantes. O país está à frente da Alemanha, cujo índice é 10,9, mas atrás de países como a Espanha (43,4), Estados Unidos (28,2) e França (28,1).

 

Candidatos a doadores

Nem todas as mortes podem ensejar a doação de órgãos, apenas as causadas por politraumatismo, acidente vascular cerebral (AVC), tumor cerebral primário, intoxicação exógena e anóxia (causada após afogamento). Mesmo nesses casos, são excluídos os possíveis doadores com doenças transmissíveis, neoplasia, uso de drogas injetáveis e cuja família tenha recusado a doação.

A negação dos familiares é apontada como uma das principais causas para o baixo número de doações, de acordo com o Conselho. Segundo o Ministério da Saúde, 47% das famílias contatadas se negam a autorizar o procedimento.

Fonte: G1